Qual é a “teoria da emanación” de Ibn Sina e Al-Farabi?

Detalhes da Pergunta

– Diz-se que a “teoria da emanación” de Ibn Sina e Farabi é contrária ao Islã. Poderia explicar como surgiu essa opinião?

Resposta

Caro irmão,

Segundo essa teoria, o universo surgiu da expansão e difusão (Extantion) gradual do Ser Divino. A base dessa teoria se assenta em grande parte na filosofia de Platão. Para Platão, tudo (o universo) procede do princípio primeiro, que está além de qualquer definição, inclusive da própria definição de ser; está além da potência e do ato, ou seja, transcende o significado da palavra “ser”. Ele insiste na “unicidade” do princípio primeiro. A procedência (emanación) de tudo do princípio primeiro significa que tudo só existe por ele. A este princípio primeiro, Farabi e Ibn Sina chamam de “pensador primeiro”. Seu pensar é a causa da existência.

A Segunda Inteligência surge da reflexão da Primeira Inteligência sobre a Existência Necessária; a Alma do primeiro céu (esfera) surge da reflexão da Segunda Inteligência sobre sua própria necessidade em relação à Existência Necessária; e o corpo do primeiro céu surge da reflexão da Alma do primeiro céu sobre sua própria possibilidade (potencialidade) em relação à sua própria essência. Este processo gradual de formação continua até a Inteligência Ativa e a esfera terrestre.

Ele critica a teoria do sudur (emanación) por contrariar a ideia de criação ex nihilo dos teólogos sunitas e por considerar o processo de emanación como necessário; por isso, ele aborda amplamente este assunto em sua obra Meşhur. Ele afirma que a consequência lógica desta teoria contraria a verdade de que Deus sabe todas as coisas.

Era uma teoria sistematizada por Ibn Sina, baseada na ideia de que Deus, ao conhecer a si mesmo, criou a Primeira Inteligência, e a Primeira Inteligência, ao conhecer a si mesma, criou a Segunda Inteligência, e assim por diante. Ou seja, nessa teoria, vários intermediários eram colocados entre Deus e as criaturas no processo de criação. Al-Kindi e Al-Farabi também defendiam a mesma visão. Gazali, como um teólogo purista, não podia aceitar essa ideia. Portanto, ele lançou um forte ataque contra essa visão de mundo sudurista, refutando-a amplamente.

Ele considera essa teoria uma especulação vazia, uma estimativa pouco confiável e um pensamento obscuro sobre a escuridão, construída sobre raciocínio indutivo. Ele argumenta que, se alguém dissesse a ele o que sonhou, todos o considerariam um doente mental. Ele afirma que, para ele, essa teoria é incapaz de satisfazer até mesmo uma pessoa louca.

A filosofia falha, por um lado, em explicar a multiplicidade e a ordem no universo, e, por outro, em preservar a unidade absoluta de Deus. Os filósofos buscam maneiras de explicar racionalmente a criação dos seres sem comprometer a unicidade e a unidade de Deus. Se se admitir que todos os seres foram criados diretamente por Deus, surge o problema de como a multiplicidade pode emanar da unidade. Finalmente, eles formulam suas teorias, afirmando que somente o Primeiro Intelecto emana de Deus, e os demais seres emanam sucessivamente de outros intelectos, resolvendo assim o problema, segundo sua perspectiva. Para eles, como Deus é absolutamente simples e único, a multiplicidade não pode existir nele. No entanto, a multiplicidade existe no Primeiro Intelecto, que é o primeiro efeito de Deus, e, portanto, a emanação da multiplicidade é possível a partir dele.

Ghazali critica a teoria da emanação dos filósofos, não desenvolvendo uma teoria de criação própria, mas sim aceitando-a tal como está, sem adicionar muito ao que o Alcorão diz sobre a criação, com a ideia de que a teoria dos filósofos leva não à unidade de Deus, mas sim à sua multiplicidade, chegando mesmo a reduzir Deus a um ser sem sentido e vazio. Ghazali analisa primeiro a validade lógica desta fórmula. Ele usa o seguinte raciocínio: de acordo com a lógica fundamental da abordagem dos filósofos, a Primeira Inteligência é capaz de emanar a multiplicidade a partir de si mesma; no entanto, para Ghazali, a extensão lógica desta teoria é que a Primeira Inteligência também está distante da multiplicidade, e portanto, a multiplicidade não pode emanar dela. Da mesma forma, de acordo com as consequências lógicas da mesma teoria, em Deus, o Único Verdadeiro, pode haver multiplicidade em vez de unidade. Ghazali examina este assunto, que requer um espírito extremamente profundo e refinado, com o máximo de detalhes.

Os filósofos indicam que uma das qualidades que expressam a multiplicidade no Primeiro Intelecto é a possibilidade de sua existência. Gázalí critica isso, questionando: se sua existência é a mesma, a multiplicidade não pode surgir dela. Porque, nesse caso, só existe a existência do Primeiro Intelecto, e portanto, Ele também é o Único verdadeiro. Assim como a multiplicidade não pode surgir do Único Verdadeiro, Deus (tese dos filósofos), a multiplicidade também não pode surgir do Primeiro Intelecto. Se a possibilidade da existência do Primeiro Intelecto é diferente de sua existência, então essa abordagem entra em contradição com a tese dos filósofos: “Há multiplicidade no primeiro princípio, porque ele existe e, ao mesmo tempo, sua existência é necessária; a necessidade da existência exige que a existência seja diferente de sua própria essência”. Se se afirmar que a necessidade da existência significa apenas existência, Gázalí responde que a possibilidade da existência também não significa nada além de existência. Segundo essa abordagem, não há grande diferença entre Deus e o Primeiro Intelecto nesse aspecto, portanto, essa teoria ou reduz Deus ao nível do Primeiro Intelecto, ou eleva o Primeiro Intelecto ao nível de Deus, sendo ambas as situações uma abordagem inaceitável.

Ghazali demonstra a inconsistência interna da teoria do *sudur* em outro ponto. Como se recorda, os filósofos atribuíam uma função extremamente importante ao ato de “pensar”. Deus, ao pensar em si mesmo, criou a Primeira Inteligência; e a Primeira Inteligência, ao pensar em si mesma e em Deus, criou a Segunda Inteligência. Ghazali analisa o assunto e tenta aproximar a questão à mente dos leitores, fazendo uma pergunta interessante: “Se for o mesmo, não há multiplicidade em sua essência, mas apenas em sua manifestação. Se for diferente, então há multiplicidade na essência do Primeiro, pois ele pensa tanto em sua essência quanto em sua essência diferente. Se essa é a multiplicidade, essa multiplicidade também existe no Primeiro. Portanto, coisas diferentes podem surgir dele. Se essa multiplicidade retira sua unidade, então abandonemos a tese da unidade em todos os aspectos”, conclui.

Contra a tese de que “Deus só pensa em si mesmo, pensar em si mesmo é o mesmo que ser si mesmo, portanto, a razão, o pensador e o pensado são um só e ele não pensa em nada além disso”, que Ibn Sina não concordava, mas que outros membros da Filosofia defendiam insistentemente, Gázali se manifestou com firmeza, afirmando que essa abordagem é inaceitável para a razão e o bom senso em relação a Deus, porque, se essa tese fosse aceita, teríamos que aceitar de antemão que Deus é inferior às criaturas.

Porque, segundo essa tese, do Primeiro Intelecto que procede de Deus, procede a alma e o corpo do céu, e ele pensa sua própria alma, seus três efeitos, sua causa e seu princípio. Portanto, o efeito (Primeiro Intelecto) é superior à causa (Deus) por este aspecto. Da causa procede apenas uma coisa, enquanto do efeito procedem três coisas. Primeiro, ele pensa apenas sua própria alma; o efeito, porém, pensa tanto sua própria alma, quanto a alma do primeiro princípio, e também a alma dos efeitos. Aqueles que acreditam que a afirmação sobre Deus está nesse nível, o colocam abaixo de todas as coisas. Porque as coisas pensam tanto suas próprias almas quanto as almas dos outros. Aquele que pensa tanto sua própria alma quanto a alma dos outros é superior a ele em grau. Porque Deus pensa apenas sua própria alma.”

Gazâlî argumenta que, nesses aspectos, a visão dos filósofos é inconsistente, pois, com a intenção de exaltar Deus, eles o relegam a uma posição inferior às criaturas.

Por outro lado, segundo os filósofos, toda substância é composta, no mínimo, de forma e matéria. Como algo composto (como um corpo) pode então surgir do nada? Ele tem apenas uma causa? Se a resposta for afirmativa, a afirmação de que algo surge do nada se torna falsa e inválida. Por outro lado, se um corpo composto tem uma causa composta, então a mesma pergunta será repetida para a causa dessa causa, e assim por diante, até que se chegue a um ponto em que essa composição necessariamente encontra algo simples. Seja onde for que essa interação entre efeito composto e causa única ocorra, ela refutará o princípio de que algo surge do nada.

Se todos os seres do universo são compostos e somente de Deus se pode dizer que possui uma simplicidade ou unidade verdadeira, pois somente Nele essência e existência são totalmente idênticas (unidas), isso nos leva necessariamente à seguinte conclusão: o princípio não pode explicar nem a composição e a multiplicidade que se observam no universo, nem o fato de Deus possuir uma unidade.

Se os filósofos precisam aceitar a tríade, como ela é caracterizada pela primeira inteligência, como algo que existe em si (o que, na verdade, é impossível), então ela será incapaz de explicar todas as outras coisas que eles querem derivar dela. Segundo eles, a matéria (corpo) do céu mais elevado, que emerge apenas de um aspecto da essência da primeira inteligência, certamente não é simples por natureza,

Como mencionado acima, é composto de forma e matéria. Na verdade, de acordo com as próprias premissas dos filósofos, todos os corpos são assim. É verdade que forma e matéria sempre existem juntas em todos os corpos, mas são tão diferentes um do outro que um não pode ser a causa do outro. Portanto, o corpo do céu mais elevado requer não um, mas dois princípios para que sua forma e matéria possam existir. O aspecto unitário da natureza triádica da primeira inteligência não pode explicar isso.

O corpo deste astro possui um tamanho determinado. Este tamanho determinado é algo adicionado à simples existência do seu ser. Ele não poderia existir com um tamanho diferente, nem maior nem menor. Neste caso, além do que é necessário para a existência do corpo do astro, seria necessário um motivo adicional para explicar a aceitação deste tamanho determinado.

Dois pontos foram identificados no firmamento superior como polos fixos. Este fato foi aceito pelos filósofos como compatível com a astronomia aristotélica. Agora, ou todas as partes do firmamento superior são semelhantes, caso em que seria impossível explicar por que dois pontos deveriam ser escolhidos como polos em detrimento dos outros; ou elas são diferentes, ou seja, algumas possuem qualidades que outras não possuem. Portanto, precisamos de um outro aspecto na primeira causa, que cause as diferenças nas várias partes do firmamento superior, justificando a escolha de dois pontos como polos.

Do ponto de vista exposto acima, defender que o corpo do céu mais elevado emana apenas de um aspecto da essência da Primeira Inteligência é uma completa “ignorância” por parte dos filósofos. Ou o princípio de que um gera um é verdadeiro, caso em que a Primeira Inteligência permanece inexplicada não apenas como trinitária, mas como multiplicidade (kesret), ou este princípio é uma fórmula vazia sem sentido, caso em que se torna possível que “muitos possam emanar de um”. Neste último caso, a infinitude e a diversidade do universo podem ser derivadas diretamente da unidade de Deus, e não há necessidade de construir uma escada esoterista entre Ele e o universo.

De repente, a fórmula que ele havia encontrado sozinha não só se torna inválida, mas, segundo Gázali, também prejudica gravemente o conceito de unidade de Deus, que é a cadeia de evidências da doutrina do *sudûr* (emanación), e assim invalida o objetivo original que eles tinham em mente ao adotá-la.

Ele faz o que quer e ordena o que deseja, e cria coisas semelhantes ou diferentes umas das outras; [portanto] quando e de que maneira Ele manifesta Sua vontade? A impossibilidade de tal crença não é nem uma verdade intuitiva, nem o objeto de um conhecimento dedutivo.”

Ghazali reconhece clara e justificadamente que o problema da relação de Deus com o mundo é, em última análise, sempre um problema que transcende a compreensão humana. Uma investigação sobre como o mundo foi criado pela vontade de Deus é, segundo ele, um “esforço vã e inútil”. A forma como a atividade criativa de Deus funciona não pode ser explicada de forma completa e definitiva, e essa inexplicabilidade é inevitável; na verdade, se pudesse ser explicada, Ele não seria “criador”. As explicações dadas às várias formas dessa atividade estabelecem uma ligação ou semelhança entre elas com base na experiência; no entanto, a criatividade de Deus é uma atividade pela qual os que experimentam e as coisas experimentadas surgem. Se a própria compreensão humana foi criada por esse ato, como pode ela compreender a essência do ato criativo de Deus?

(ver Imam-ı Gazâlî, Tehafüt el-Felâsife, trad. Bekir Karlığa, Çağrı Yayınları, 1981; Bünyamin Duran, A Mudança Conjuntural da História do Islã, Nesil, Istambul, 1997.)


Com saudações e bênçãos…

O Islamismo em Perguntas e Respostas

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