Caro irmão,
As palavras contidas na carta em questão não pertencem ao Imam Rabbani. Entende-se que o autor dessas palavras era alguém estimado por ele. Em resumo, Imam Rabbani respondeu àqueles que perguntaram sobre o significado dessas palavras, da seguinte forma:
A expressão em questão refere-se ao “cúfiro” (infidelidade) da tarikat. Este cúfiro é encontrado em um estágio da jornada do “seyru sülûk”. Aquele que se encontra neste estágio não distingue o bem do mal, assim como não distingue o Islã do cúfiro. Para ele, o cúfiro é tão bom quanto o Islã, pois ambos são manifestações dos nomes de Deus.
Assim como é o reflexo de um nome, também é o reflexo de outro nome. A pessoa que está neste nível sente prazer e deleite na manifestação de ambos os nomes.
A blasfêmia que Mansur al-Hallaj também abraçou é essa blasfêmia. Todas as excentricidades de alguns membros da ordem sufista são produto dessa posição.
Este estado surge de uma inspiração, uma absorção, uma perda de si mesmo, uma condição espiritual que resulta do amor de Deus que invade a pessoa.
Quando o viajante espiritual supera este estágio e atinge um nível mais elevado, ele se liberta dessa confusão e consegue distinguir e reconhecer o bem do mal. Esta é a fé que o Profeta (que a paz esteja com ele) expressou em sua oração.
A expressão “ten” na frase significa “companheiro”. Porque, desde o momento em que nasce, uma pessoa tem um demônio que a acompanha, que é sempre seu companheiro/par.
Não se pode ser um verdadeiro muçulmano sem cortar a cabeça desse demônio, que é como um irmão, sem destruí-lo espiritualmente, sem se libertar da atmosfera de suas sugestões. Porque não é possível entregar-se totalmente a Deus e ao Islã sem rejeitar a submissão ao demônio.
Considerando também a amizade do diabo com a alma egoísta, a dimensão dessa irmandade é melhor compreendida.
O significado de “o lugar que ocupa” é: a pessoa que ocupa o lugar é ela mesma.
Cada ser humano é considerado uma manifestação ou existência que surge nos estágios do corpo. E, como esse estágio de manifestação é considerado uma espécie de nascimento, eles deram esse nome a esse estágio.
A expressão indica que uma pessoa não pode nascer no mundo como um ser humano sem que sua dimensão de sombra/esfera inferior se una à sua dimensão de ser/esfera superior.
Ao fazer essas observações, Imam Rabbani não deixou de acrescentar a seguinte nota:
Na carta 393, Imam Rabbani explica as palavras de um indivíduo que dizia não ver diferença entre Deus e o Profeta Muhammad (que a paz seja com ele). Ele descreve que tais palavras provêm de um estado de embriaguez e absorção.
Significa ver os nomes e atributos de Deus em tudo, ignorando todas as outras existências e vendo apenas a Deus. Como esse tipo de êxtase/unificação é uma espécie de embriaguez causada pela atração do Divino, eles não são responsáveis por suas palavras.
Contudo, se alguém que não está em estado de êxtase/consciência plena dissesse algo assim, seria blasfêmia. Por isso, Imam Rabbani diz isso. Ou seja, não é realmente uma blasfêmia, mas devido à inspiração que ocorre durante o caminho e a jornada da tarikat, eles se deixam levar por seu próprio temperamento e fazem esses tipos de declarações.
Como não veem nada além de Deus, passam da unidade (tawhid) para a união (ittihad). Mas quando saem daquele estado e entram no estado de vigília/despertar, veem que tudo tem uma existência própria e abandonam a união. Caso contrário, dizer algo assim no estado de vigília é, de acordo com a lei islâmica, uma blasfêmia.
Portanto, o fato de alguns membros de ordens sufistas terem sido condenados à morte pela espada da lei islâmica ao longo da história se deve a esse tipo de excesso. O juiz/cadi aplicou a lei islâmica de acordo com sua interpretação literal. E o condenado, por sua vez, tornou-se um mártir.
Com saudações e bênçãos…
O Islamismo em Perguntas e Respostas